Publicidade
19/04/2015 - 02h00

Empresas multinacionais importam para o Brasil políticas de diversidade sexual

FERNANDA PERRIN
DE SÃO PAULO

Uma funcionária do Citibank grávida procurou a área de recursos humanos para tirar licença-maternidade, e um grande debate se instalou na filial brasileira do banco.

Como ela é casada com outra funcionária do Citi, a empresa não sabia se concedia o benefício à gestante ou ao casal, já que não havia regulação específica no Brasil.

O próprio banco, então, interpretou que as duas seriam mães da criança, e concedeu o benefício a ambas.

O caso ilustra uma das conclusões da pesquisa Demitindo Preconceitos, da consultoria Santo Caos: as empresas multinacionais estão importando para o país práticas corporativas de valorização e inclusão da diversidade sexual, colocando-se à frente das empresas brasileiras.

"Nós não encontramos nenhuma empresa brasileira que faça algo igual ou melhor que as multinacionais", afirma Jean Soldatelli, coordenador do estudo da Santo Caos.

Na filial local da P&G, por exemplo, a inclusão do marido ou mulher no seguro-saúde para casais do mesmo sexo é anterior ao reconhecimento do casamento homoafetivo no Brasil, em 2011.

Para que isso fosse possível, a empresa dispensou a apresentação da certidão de casamento, conta José Gerardo Mora, 34. O venezuelano foi transferido para o Brasil em 2009 junto com o marido Simón, também da P&G.

Karime Xavier/Folhapress
José Gerardo Mora (à direita), 34, conheceu o marido Simón na P&G
José Gerardo Mora (à direita), 34, conheceu o marido Simón na P&G

Mora lidera um grupo oficial de funcionários LGBT da empresa que, em parceria com a área de recursos humanos, desenvolve treinamentos em diversidade sexual.

A P&G não é a única a ter grupos como esse. Nos últimos cinco anos, sobretudo, a prática tem sido adotada pelas filiais brasileiras de multinacionais, nos moldes do que já existe nos Estados Unidos e na Europa. Carrefour e J.P. Morgan também têm grupos LGBT atuantes aqui.

"Nós ainda somos uma sociedade preconceituosa. As empresas internacionais são mais abertas a este tema", diz José Berenguer, presidente do J.P. Morgan no país.

O grupo "Pride Brazil" (orgulho Brasil) foi criado no banco de investimentos em junho de 2013.

Uma de suas principais atividades –que são financiadas pela empresa– é a organização de eventos e palestras, das quais os altos executivos são incentivados a participar.

Pesquisa do Centre for Talent Innovation mostrou que a probabilidade de um funcionário LGB se assumir no trabalho é 1,2 vezes maior quando altos executivos heterossexuais manifestam publicamente seu apoio à diversidade sexual.

Gabriel Morais, 26, trabalha em uma agência de publicidade. Ele diz que, por sempre ter trabalhado com outros profissionais homossexuais, nunca sentiu a necessidade de se esconder.

Danilo Verpa/Folhapress
Gabriel Morais, 26, trabalha em uma agência de publicidade e disse nunca ter sido discriminado
Gabriel Morais, 26, trabalha em uma agência de publicidade e disse nunca ter sido discriminado

"Eu tive sorte de sempre ter sido tratado do mesmo jeito. 'Sorte' entre aspas, na verdade, porque é como todo mundo deve ser tratado."

MORAL DE MERCADO

O objetivo dessas iniciativas é criar um ambiente em que os profissionais sintam-se à vontade para assumir sua identidade, não só por um discurso de bem-estar do funcionário, mas porque isso faz bem à empresa.

Segundo pesquisa da Deloitte, quando profissionais não se sentem à vontade para se assumir, a produtividade é afetada –seja pelo esforço em esconder-se, seja pelo impacto sobre a percepção de oportunidades e compromisso com a empresa.

"Eu estou tirando essa questão de um aspecto moral. São pessoas criativas, boas no que fazem, e elas serão mais produtivas na medida em que a empresa tenha uma cultura de diversidade", diz Ciro Mortela, da Pfizer.

O estudo Diversidade Importa, da McKinsey, mostrou que diversidade de gênero melhora em 15% a performance financeira das empresas ao atrair talentos e produzir melhores resultados na abordagem do consumidor, satisfação dos empregados e tomada de decisão.

Giovanni Zappile, 27, trabalha na Here, subsidiária da Nokia. Ele afirma que se surpreendeu quando, com apenas dois meses na empresa, um funcionário mais antigo foi demitido por se recusar a trabalhar com ele.

Karime Xavier/Folhapress
Giovanni Zappile, 27, trabalha na Here, subsidiária da Nokia
Giovanni Zappile, 27, trabalha na Here, subsidiária da Nokia

Zappile diz que não foi informado do motivo que o ex-colega apresentou para a recusa, mas especula que tenha sido por sua sexualidade.

A atração de profissionais talentosos é outra motivação para a adoção de práticas inclusivas pelas empresas.

"Nosso mercado no Brasil é competitivo, então quanto mais eu for uma opção de carreira interessante pro meu público, mais facilidade eu vou ter em recrutar", diz Berenguer, do J.P. Morgan.

Nenhuma das empresas contatadas pela Folha disse temer ter sua imagem prejudicada diante de um público mais conservador.

No Carrefour, os treinamentos não se limitam ao ambiente interno. Um dos pontos abordados é como lidar com um cliente que tenha uma atitude discriminatória contra um empregado da empresa –e, nesse caso, a razão não é do freguês.

"Lá atrás, nós ponderamos [a reação do cliente], mas julgamos que era muito mais importante enfrentar essa questão. E o que colhemos foi um resultado muito diferente do senso comum", diz Paulo Painez, do Carrefour Brasil.

A empresa tem parceria com a TransEmpregos, especializada no recrutamento de pessoas trans.

"Meu objetivo é influenciar. Acho que o banco tem um papel importante em demonstrar o valor dessa estratégia para a sociedade", diz Berenguer, do J.P. Morgan.

 

Publicidade

 
Busca

Encontre vagas




pesquisa

Publicidade

 

Publicidade

 

Publicidade
Publicidade

Publicidade


Pixel tag