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20/09/2015 - 02h00

Em busca de nova carreira, profissionais de 40 anos voltam a ser estagiários

FERNANDA PERRIN
DE SÃO PAULO

Jane Kawakami, 54, divorciada, três filhos e... estagiária. Elieser Guilherme, 40, casado, uma filha e... estagiário. Como eles, há cerca de 7.200 profissionais com 40 anos ou mais ocupando esse cargo só no banco de dados do Centro de Integração Empresa-Escola -20% mais do que havia em 2013.

A expansão do financiamento no ensino superior que ocorreu nos últimos anos, via Fies (Fundo Investimento Estudantil) e Prouni (Programa Universidade para Todos), foi o empurrão que faltava para que insatisfeitos com a carreira se dessem uma segunda chance.

"Essa fase dos 40 anos é propícia porque a pessoa já tem uma casa própria, já criou os filhos, e aí ela vai fazer o que gosta", avalia Rafaela Gonçalves, especialista em treinamento do Núcleo Brasileiro de Estágios (Nube).

Aos 52 anos, Kawakami decidiu estudar serviço social. Ela conta que sempre quis ter uma formação superior, mas priorizou o casamento e os filhos. Com a independência deles e a separação do marido, conseguiu parte do tempo e dos recursos que precisava para fazer a faculdade.

O restante, ela complementa com uma bolsa do Prouni. Como o curso é a distância, ela conseguiu manter o emprego de atendente em um posto de saúde na parte da manhã e, à tarde, dedicar-se ao estágio.

Karime Xavier/Folhapress
Jane Kawakami (segunda, da dir. para a esq.), 54, com colegas no Instituto de Medicina Avançada, em São Paulo
Jane Kawakami (segunda, da dir. para a esq.), 54, com colegas no Instituto de Medicina Avançada, em São Paulo

Há quase dois anos, é estagiária no Instituto de Medicina Avançada. No começo, ela diz ter ficado apreensiva -depois dela, a estagiária mais velha tem 20 anos.

Mudanças de rota como a de Kawakami refletem a transformação do conceito de carreira vivida pela geração hoje na faixa dos 40 anos, explica a professora Aline Souki, da Fundação Dom Cabral. São profissionais que entraram no mercado quando o mais importante era ter um bom salário e estabilidade.

Atualmente, a satisfação pessoal também entrou na conta, o que tem motivado profissionais a repensarem suas carreiras, priorizando o prazer em vez da renda.

Essa vontade é uma das principais vantagens do estagiário mais velho em relação ao jovem. "Como ele está se realizando, é muito mais produtivo, além de ter experiência em outras áreas e ser mais maduro", avalia Souki.

"Quando você está recomeçando, você não quer perder tempo, tem mais comprometimento", defende Elieser Guilherme, 40, estagiário no departamento jurídico do Sindicato dos Comerciários de São Paulo.

Guilherme deixou o cargo de gestor comercial para cursar direito, plano que adiou por anos. Ele espera que o estágio o ajude a entrar no mercado de trabalho da nova área e diz que não estranha o fato de sua chefe, a advogada Andrea Leandro, 37, ser mais nova do que ele.

Mas cenários que envolvam uma diferença de idade grande entre chefe e subordinado podem causar problemas se a empresa não estiver preparada para lidar com isso, dizem especialistas.

Karime Xavier/Folhapress
A advogada Andrea Leandro, 37, e o estagiário Elieser Guilherme, 40, no escritório do Sindicado dos Comerciários de São Paulo
A advogada Andrea Leandro, 37, e o estagiário Elieser Guilherme, 40, no escritório do Sindicado dos Comerciários de São Paulo

Para Souki, o estagiário mais velho precisa ter a mente aberta para não estranhar a inversão de papeis, ao responder a um superior jovem.

Já o gestor tem que levar em conta a insegurança desse estagiário, que questiona sua decisão de mudança, afirma Guilherme Françolin, da consultoria Santo Caos.

Cresce número de universitários

FINANÇAS

Para um jovem universitário, estágios são uma porta de entrada para o mercado de trabalho e, de quebra, uma fonte de renda para pagar a cerveja da festa na sexta.

Aos 40 anos, as preocupações financeiras vão além do lazer e pesam mais no orçamento do que uma bolsa auxílio é capaz de cobrir.

Elieser Guilherme, 40, teve que vender o carro e outros bens para conseguir trocar o emprego de gestor comercial por um estágio no departamento jurídico do Sindicato dos Comerciários de São Paulo. "A vida financeira deu uma regredida", diz.

Ele ainda conta com a ajuda da filha, de 18 anos, também estagiária na Sabesp, e da mulher.

Ganhando R$ 1 mil -um quinto do que ganhava como supervisor de vendas-, Leandro Oliveira, 40, voltou para a casa da mãe. Estagiário em gastronomia, ele diz que o dinheiro é a maior dificuldade que encontrou na mudança de carreira.

Estágios mais bem pagos

"A área de gastronomia é ainda pior que outras porque muitos estágios não são remunerados. Um chef importante acha que o nome dele é suficiente como pagamento."

Uma das recomendações para quem está pensando em dar esse passo é se preparar financeiramente, afirma Carlos Henrique Mencaci, presidente da Associação Brasileira de Estágios (Abres).

Segundo a organização, o valor médio de bolsa auxílio pago para estudantes de nível superior no Brasil é de R$ 1.100,07.

O planejamento deve levar em conta o custo da graduação, no caso de faculdades privadas, e a diminuição de renda que a troca do emprego atual pelo estágio acarretará.

O profissional também precisa pensar no longo prazo e ter em mente o tempo que levará até atingir na nova carreira o mesmo patamar que tinha na antiga.

Com o estágio em uma escola infantil em Barueri e o curso de pedagogia, o jeito que Nilza Rodrigues, 55, encontrou para complementar as contas foi fazer trabalhos temporários como manicure e depiladora durante a noite, único período livre que tem disponível no dia.

Ela espera que o esforço seja compensado com a aprovação em um concurso para dar aulas na rede pública.

Há casos, porém, em que a idade avançada ajuda. Jane Kawakami, 54, conta com o dinheiro da aposentadoria, que deve sair nos próximos meses, para complementar a renda do estágio em serviço social em uma clínica médica em São Paulo.

 

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