Detetives ganham até R$ 1.500 por dia no encalço de traições e empresas
FERNANDA PERRIN
DE SÃO PAULO
Antes de começar a falar, Marco Antônio Xavier, 32, perguntou o nome completo da repórter para checar se era de fato uma jornalista da Folha. "É que muitas pessoas vêm até mim atrás de informações", justificou-se.
Xavier é dono da Sabra Inteligência e Investigação, com foco no mundo corporativo. Os serviços vão desde infiltração de investigadores entre funcionários para apurar desvios de mercadorias a levantamento do passado de potenciais sócios. "É uma espécie de auditoria velada", diz.
Para cada serviço, é assinado um contrato entre as partes que inclui uma cláusula de confidencialidade. Tudo o que for descoberto é relatado apenas para o cliente, sob pena de multa.
Nenhum trabalho pode invadir a privacidade dos investigados. Diferentemente dos agentes de polícia, que podem conseguir autorização na Justiça para grampear telefones, os detetives particulares devem se limitar a espaços públicos. Privados, como uma empresa, apenas com autorização do dono.
Com uma equipe de quatro pessoas, Xavier diz que atende em média oito organizações por mês. O preço por "alvo" (pessoa a ser investigada) é a partir de R$ 15 mil.
Bacharel em direito, o empresário reclama da falta de um curso especializado em investigação privada que seja regulamentado pelo Ministério da Educação (MEC).
Mauro Pimentel/Folhapress | ||
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O detetive particular Luiz Gomes em seu escritório, no Rio |
A Academia de Inteligência Privada, com sede no Rio, se autoproclama "a melhor escola de detetives do Brasil". Desde 2003, ela oferece os cursos de detetive privado (nas modalidades presencial, por R$ 1.800, e a distância, por R$ 500) e psicologia criminal (R$ 300).
Por ano, são formados cerca de 80 profissionais, diz o detetive Luiz Cláudio Gomes, coordenador da escola. Para aprender a prática, porém, ele recomenda a busca de um "tutor": alguém experiente que deixe o novato acompanhar seu trabalho. Esse também é o melhor caminho para tornar-se conhecido no mercado, que funciona na base de indicações.
"É um ramo muito fechado. É difícil você chegar em uma agência e pedir um emprego", diz Fabrício Dias, 36, presidente da Líder Detetives, com sede em São Paulo. Dias coordena o trabalho de 16 agentes, entre especialistas em TI e "campaneiros", jargão da área para quem passa até dez horas por dia seguindo alvos nas ruas.
Cerca de 40% dos casos em que Dias trabalha são suspeitas de traição do parceiro ou de uso de drogas pelos filhos. O restante são investigações empresariais, contraespionagem (averiguar se o cliente não está sendo monitorado) e litígios judiciais, como estimar a renda do alvo para pedido de pensão alimentícia. Uma investigação de uma semana gira em torno de R$ 5.500, afirma Dias.
SEM REGRAS
A ocupação de detetive profissional é reconhecida pelo Ministério do Trabalho, mas nunca foi regulamentada. Na falta de especificações, as fronteiras entre o legal e o ilegal são nebulosas.
Uma escuta instalada por um detetive em uma casa com autorização do proprietário interessado em investigar o cônjuge, por exemplo, é legal para o professor de direito processual penal da USP Gustavo Badaró, e uma violação de intimidade para o advogado e ex-delegado de polícia Frederico Pinto.
"Hoje não existe um regramento que defina limites para a atuação do detetive", afirma o deputado federal Ronaldo Nogueira (PTB-RS), autor do projeto de lei 1.211 de 2011, cujo objetivo é regulamentar a profissão.
Karime Xavier/Folhapress | ||
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O detetive Fabrício Dias, da Líder Detetives, em seu escritório, em São Paulo |
A proposta, que aguarda votação no Senado, estende a formação para 600 horas, determina que a grade seja definida pelo Conselho Nacional de Educação (MEC) e proíbe o profissional de divulgar as informações às quais teve acesso. Caso o detetive perceba que seu cliente pretende cometer um crime com os dados coletados, o projeto estabelece que ele deve comunicar a polícia.
A possibilidade de "investigação defensiva", prevista no projeto do novo Código de Processo Penal (em tramitação), é outra novidade que pode afetar a profissão.
De acordo com Badaró, um dispositivo semelhante introduzido na Itália em 2011 permitiu a detetives particulares pedirem autorização na Justiça para "atividades invasivas", como uma busca e apreensão. "Ele dá prerrogativas de polícia a um investigador privado", diz o professor.
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DOSSIÊ PROFISSIONAL
Tarefas incluem seguir alvos, instalar escutas e se infiltrar em empresas
Formação
>> Escolaridade média e mais de 400 horas-aula de curso especializado
Atividades
>> Contraespionagem (verificar se cliente é monitorado)
>> Análise do histórico de funcionários e de sócios
>> Investigação de suspeitas de traição amorosa
>> Averiguação de uso de drogas entre adolescentes
>> Localização de pessoas com quem se perdeu contato, ou desaparecidas
>> Busca de animais perdidos
Técnicas
>> Seguir rotina do alvo por até dez horas por dia
>> Colocar rastreadores em automóveis
>> Instalar escutas na casa
>> Infiltrar-se em empresas
>> Análise de documentos
Limites
>> Acesso a espaços privados, apenas com autorização do proprietário
>> É proibido fazer escutas telefônicas
>> Uso de armas de fogo (só para quem tem porte legal)
Preço
>> Remuneração pode ser cobrada por diária ou por caso
>> Diárias variam de R$ 500 a R$ 1.500, em média
>> Casos podem chegar até a R$ 20 mil, dependendo da complexidade
MERCADO
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>> Empresas no Estado de São Paulo fazem investigação particular*
*Dado da Junta Comercial do Estado de São Paulo
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