Oferta de microapartamentos segue tendência demográfica
PHILLIPE SCERB
DE SÃO PAULO
A oferta crescente de microapartamentos não é por acaso. Em 1980, 5,8% dos domicílios brasileiros eram ocupados por apenas uma pessoa. Trinta anos depois, homens e mulheres vivendo sozinhos já totalizavam 12,7% das residências do país, de acordo com o IBGE.
No futuro, a tendência é que esses arranjos familiares fiquem ainda mais comuns, segundo o demógrafo e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, José Eustáquio Alves.
Os motivos são diversos: "A proporção de idosos está crescendo e, portanto, o número de viúvos; melhores índices de educação fazem com que jovens tenham mais condições de viver sozinho; e as pessoas se separam com mais frequência e se casam cada vez mais tarde", enumera.
Para Ricardo Martucci, professor aposentado do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos, esses dados se contrapõem a uma cultura brasileira de supervalorização do espaço.
Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
Aline Oliveira, em seu apartamento de 20 m², no centro de São Paulo |
Em Buenos Aires, segundo ele, é muito difícil, mesmo em regiões nobres, encontrar apartamentos com mais de 150 m². "Há imóveis de 700 m² sendo lançados na Vila Olímpia. Isso é sinônimo de bem-estar?", questiona.
Para ele, a arquitetura evoluiu de tal forma que áreas pequenas podem oferecer conforto. "A metragem não tem valor em si. Tudo depende de como você a utiliza."
O fenômeno recente dos compactos está ligado também a uma ideia de que é possível viver com pouco.
A fotógrafa Aline Oliveira, 39, diz estar satisfeita com os 20 m² do seu apartamento, no centro de São Paulo. "Tudo o que uso está aqui, não preciso de mais nada."
Ficar pouco em casa ajuda. "Eu pedalo muito, vou a exposições, teatros, cinemas e bares. Estou sempre na rua."
O casal Adriane, 41, e Percival Deimann, 57, também entrou na onda dos compactos. Eles trocaram a casa de 600 m², três carros e vários empregados no Alto de Pinheiros por um apartamento de 40 m² na zona sul.
"Revi meus hábitos de consumo, e hoje tenho controle sobre a minha casa, é muito mais prático e prazeroso."
14 M² É MUITO
Microapartamentos já são realidade em cidades como Tóquio, Paris e Nova York, onde é possível encontrar imóveis de até 6 m².
Clara Irazabal Zurita, professora da escola de Arquitetura, Urbanismo e Preservação da Universidade Columbia, em Nova York, diz que pequenos apartamentos, se bem projetados, podem oferecer bem-estar por um preço acessível, algo difícil em mercados superaquecidos.
Neste ano, a cidade americana recebeu o primeiro complexo de compactos, o My Micro NY (minha pequena Nova York), que com unidades prefabricadas de 24 m² a 33 m² promete democratizar o acesso à moradia.
O lado ruim, segundo Zurita, é que, se forem muito pequenos ou mal projetados, os microapartamentos podem ser "psicologicamente opressores se não houver estrutura urbana adequada e se os moradores não tiverem condições de aproveitar o espaço público", afirma.
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