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10/05/2015 - 02h00

Escritório de advocacia comandado por mulheres facilita cuidado dos filhos

NOAM SCHEIBER
DO "NEW YORK TIMES"

Pouco depois das 9h30 em uma manhã de quarta-feira, depois de dirigir 20 minutos para levar o filho Jack à escola e muito, muito depois de responder ao seu primeiro e-mail do dia, Maria Simon estava sentada a uma mesa de reunião tentando calcular a probabilidade de que pudesse comparecer a uma festa na escola de Jack dentro de dois dias.

Simon estava determinada a comparecer, mas a festa estava marcada para as 12h30, e ela sabia que se fosse teria toda a sua tarde ocupada. "Se ele me vir lá, não poderei ir embora", ela disse.

Lexey Swall/The New York Times
Maria Simon, sócia do escritório de advocacia Geller Law Group, com seu fillho Jack, 4, em sua casa em Washington (EUA)
Maria Simon, sócia do escritório de advocacia Geller Law Group, com seu fillho Jack, 4, em sua casa em Washington (EUA)

Mas ela não fez o comentário em tom de receio. Para ela, a oportunidade de passar algumas horas durante o expediente em companhia de um agitado menino de quatro anos era um dos principais benefícios de seu trabalho.

Simon é sócia no Geller Law Group, um escritório de seis advogadas cujo lema é facilitar a vida em família e cuja postura quanto a presença constante no escritório poderia ser descrita como "agressivamente oposta".

Simon e Rebecca Geller, sua sócia no escritório, têm a determinação de mostrar que pais e mães podem nutrir suas ambições profissionais e manter presença constante na vida de seus filhos. "Acho que as mulheres podem ter tudo", diz Simon. "Depende só de seu paradigma sobre o que é 'tudo'".

O paradigma de Simon não é algo que a mulher que popularizou a ideia de ter "tudo" endossaria. Helen Gurley-Brown, por muito tempo editora da revista "Cosmopolitan", em 1982 publicou um livro chamado "Como Ter Tudo: Amor, Sucesso, Sexo, Dinheiro, Mesmo Começando do Nada".

Brown não tinha filhos e não estava especialmente ansiosa em incorporá-los à sua visão da vida feminina moderna. Mas o termo pegou, de alguma maneira, como resumo das aspirações das mulheres que são mães e trabalham.

AGENDA CORRIDA

Embora a advocacia, como profissão, não ofereça o pior retrospecto nessa área -a distinção provavelmente cabe às finanças-, os desafios que ela oferece são consideráveis. Os advogados interessados em se tornarem sócios precisam tipicamente trabalhar entre 60 e 70 horas por semana.

As mulheres respondiam por apenas 16,5% dos sócios em escritórios de advocacia dos Estados Unidos em 2013, de acordo com a National Association for Law Placement, a despeito de se formarem em Direito em número semelhante ao dos homens, nos dez anos precedentes.

Um relatório do MIT Workplace Center, em 2007, constatou que a razão mais importante, por larga margem, para que as mulheres abandonem a trajetória profissional que as tornaria sócias é "a dificuldade de combinar o trabalho em um escritório de advocacia e cuidar dos filhos, em um sistema que requer longas horas e exerce intensa pressão sobre os profissionais, com apoio pequeno ou inconstante a arranjos de trabalho flexíveis".

Uma antiga advogada associada do escritório Mayer Brown, em Chicago, contou que a estratégia do escritório quanto ao equilíbrio entre vida privada e vida profissional era "terceirize sua vida privada", o que significa encontrar um cônjuge disposto a ficar em casa com os filhos ou contratar uma babá, cozinheira e faxineira.

Era essa terceirização que deprimia Simon e Geller, que consideram as obrigações domésticas como centrais para o "ter tudo" na versão que interessava a elas. Geller queria passar algumas horas de seu horário diurno em companhia dos filhos, mas sem ter de abandonar sua carreira no Direito.

"Eu não tinha exemplos que não contassem com um marido que ficasse em casa para cuidar dos filhos", diz Geller, sobre as sócias do grande escritório de advocacia que ela deixou para criar o Geller Law Group em 2011.

Simon queria jantar com a família e participar de eventos escolares sem se preocupar sobre como essa atitude afetaria sua avaliação anual.

Ela começou na Geller como advogada em tempo parcial, mas em poucos meses seu compromisso de trabalhar entre 10 e 15 horas por semana se tornou uma jornada de 60 a 70 horas. Ela também estava passando por um divórcio, o que subitamente tornou necessário um emprego de período integral.

Geller, mães de dois meninos, de seis e quatro anos, e de uma menina de um ano, passa as terças e quintas-feiras com seus dois filhos mais novos, levando-as a aulas de música e passeios com os colegas, e trabalhando nos períodos em que eles descansam.

Lexey Swall/The New York Times
Rebecca Geller, do Geller Law Group, com seu filho Noah, 4
Rebecca Geller, do Geller Law Group, com seu filho Noah, 4

Muitas de suas tarefas, como telefonemas de apresentação e administrar o fluxo diário de perguntas dos clientes, podem ser realizadas nesses momentos de pausa durante o dia.

"Meu antigo escritório me deixava louca", disse Geller. "Se minha semana estava fraca, por que não me deixar tirar um dia de folga, cuidar de coisas pessoais? Pode ter certeza, se alguma coisa urgente aparecer, estou disposta a virar a noite trabalhando".

Ela recentemente levou os filhos ao médico. "Tive cinco minutos livres, assim que Emily se acalmou", disse Geller, entusiasmada por ter uma janela de produtividade em meio ao caos dos checapes anuais. "Enviei seis e-mails".
Para se manterem em contato, as advogadas e um pesquisador jurídico atualizam meticulosamente suas agendas compartilhadas, no Google, e se comunicam constantemente via Gchat.

SOLUÇÃO PARA TODOS?

A estrutura não é para todos. Michael Munson, o único homem entre os advogados associados do escritório, disse que deixou a empresa em fevereiro porque queria mais camaradagem com os colegas. Mas esse estilo está se difundindo rapidamente, com dezenas de escritórios semelhantes abertos em todo o país nos últimos 10 anos, de acordo com Joan Williams, do Center for WorkLife Law, no Hastings College of Law, Universidade da Califórnia.

No entanto, continuam a existir desafios. A despeito do baixo custo fixo do escritório, perder o faturamento de uma advogada pelos diversos meses de uma licença-maternidade seria um peso para as finanças da empresa, disseram as sócias.

Elas adquiriram um plano de saúde que banca 60% dos salários de uma advogada durante oito semanas de licença-maternidade, e oferecem outras quatro semanas de licença não remunerada. Os grandes escritórios de advocacia normalmente oferecem de 14 a 16 semanas de licença-maternidade com remuneração integral.

É um dos dilemas do conflito entre vida pessoal e profissional. Os grandes escritórios contam com os recursos necessários para acomodar as obrigações de família de seus advogados. Mas não são muito simpáticos a isso.

Em contraste, muitos escritórios pequenos têm uma postura favorável mas não contam com recursos para implementar esse tipo de política.

Simon e Geller reconhecem que terceirizar as funções maternas tem vantagens -como saber que alguém estará lá para cuidar das crianças se elas passarem do horário no trabalho.

Em lugar dessa certeza, existem dezenas de pequenos cálculos: quando o trabalho para um cliente é importante o bastante para justificar o abandono das responsabilidades maternas, e que clientes podem ser empurrados para a frente caso surja a necessidade?

O fato de que cálculos como esse sejam inescapáveis talvez seja o mais pesado custo psíquico do horário flexível, de acordo com outras pessoas que tentaram esse sistema.

Joanne Sternlieb foi advogada em um grande escritório mas o deixou para abrir sua empresa em 2002, para que pudesse cuidar dos dois filhos e acompanhá-los em suas competições de natação e peças escolares no horário do expediente. Mas vendeu o escritório que abriu, dez anos mais tarde, depois que sua filha mais velha chegou à adolescência.

"Quando elas eram mais novas, eu precisava estar lá fisicamente, assistir aos eventos", ela disse. Mais tarde, "era importante que eu estivesse lá não física, mas emocionalmente".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

 

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