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12/07/2015 - 02h00

Start-ups bilionárias deixam de ser mito, mas ainda são raras

FARHAD MANJOO
DO "NEW YORK TIMES"

Aileen Lee tentou alguns outros termos de menor impacto antes de se decidir por "unicórnio". Um deles era "home run". Outro era "megassucesso". Nenhum funcionava com perfeição para aquilo que ela buscava –uma palavra incomum e misteriosa para descrever aquilo que, no mundo da tecnologia, era um fenômeno incomum e misterioso: as companhias de software norte-americanas que atingem valor de mercado de pelo menos US$ 1 bilhão.

Era o final de 2013 e Lee, veterana do setor de capital para empreendimentos, havia conduzido um estudo do mercado de start-ups nos dez anos precedentes e estava se preparando para publicar suas constatações em um artigo para a revista on-line TechCrunch.

Mas a nomenclatura estava se provando um problema. Embora o Vale do Silício já estivesse há décadas tentando aprender a separar os vencedores dos derrotados na tecnologia, jamais havia cunhado um nome para o tipo de empresa iniciante que o setor mais aprecia.

"Que palavra descreveria aquilo que todos nós estamos tentando fazer", recordou Lee em entrevista recente, "ou seja, encontrar, ou trabalhar para, ou investir em, uma companhia que seja vencedora entre as vencedoras?"

E então a palavra lhe ocorreu: unicórnio. "Parecia certa", ela disse. "Legível e divertida, e não havia sido usada antes para descrever a mesma coisa".

O uso do termo explodiu imediatamente: o artigo de Lee –cujo título era "Bem Vindo ao Clube do Unicórnio: Aprendendo com as Startups Bilionárias"– foi postado cedo em uma manhã de sábado, e não demorou a causar uma tempestade de tuítes e comentários em blogs de investidores e fundadores de empresas de tecnologia, com muitos deles adotando o termo.

Steve Jennings/Getty Images
Aileen Lee dá palestra em evento em San Francisco (EUA)
Aileen Lee dá palestra em evento em San Francisco (EUA)

Em poucas semanas, "unicórnio" se tornou parte do jargão do Vale do Silício. O fato de que imensas quantias de dinheiro estivessem sendo despejadas em start-ups naquele momento, criando mais e mais empresas bilionárias, ajudou, por dar a todo mundo novas oportunidades de empregar o termo. E foi o que fizeram: na capa da revista "Fortune", em praticamente todos os artigos sobre novas rodadas de capitalização, e nas reuniões de conselho do setor de tecnologia.

Hoje, não existe um termo que resuma melhor tanto o otimismo justificado quanto o superaquecimento do Vale do Silício. A palavra também se tornou muito útil para explicar o que está acontecendo no negócio do capital para empreendimentos.

Ainda que o termo seja ocasionalmente criticado como mais um jargão sem sentido em um setor que já sofre em excesso disso, boa parte do atrativo se relaciona ao significado preciso: "US$ 1 bilhão!". Praticamente todo mundo no setor concorda com o fato de que uma avaliação de US$ 1 bilhão realmente é um marco de que uma empresa iniciante conquistou sucesso em grandíssima escala.

Em apresentação recente, a Andreessen Horowitz, uma das maiores empresas de capital para empreendimentos do setor, explicou que uma das maiores diferenças entre o atual boom da tecnologia e o dos anos 1990 era a disparada na capitalização privada de companhias em "estágio posterior". Ou, nas palavras da apresentação, "a caça ao unicórnio é a grande diferença".

Mas unicórnio também sugere tanto a ambição quanto o absurdo inerentes ao setor de tecnologia hoje: a ideia de que conectar os bits e bytes certos pode resultar em uma criatura mítica, mágica.

Um motivo para que o Vale do Silício seja alvo de admiração e zombaria simultâneas é que as pessoas do setor dedicam seu tempo a buscar impossibilidades empresariais. Companhias como a Uber e a Airbnb talvez parecessem verdadeiros azarões no começo, e no entanto agora se tornaram genuínos sucessos mundiais.

A despeito do amplo uso do termo cunhado por ela, Lee curiosamente não leva grande crédito por ele. A empresa para a qual ela trabalha, a Cowboy Ventures, raramente é mencionada em conexão com os unicórnios –nem pela seleção da palavra e nem pela análise que cristalizou o conceito.

Em seu site, a empresa postou um curto "Guia de Tratamento de Unicórnios", no qual solicita que as pessoas que empregam o termo atribuam crédito à Cowboy Ventures. Chega até a oferecer orientação específica sobre como fazê-lo: "Inclua uma referência e link para a Cowboy Ventures ou nosso post no TechCrunch no texto do parágrafo em que primeiro mencionar unicórnios ou o clube dos unicórnios", o guia sugere.

"Sim, acho bacana quando as pessoas nos dão crédito", disse Lee, defendendo o guia. "E obviamente muita gente não o faz". Ela faz uma pausa e acrescenta: "Mas a verdade é que você não pode se deixar incomodar por isso".

Com o tempo, as críticas ao termo e ao conceito cresceram. Uma das mais recentes é que a palavra descreve uma situação que já não é assim tão incomum.

Em 2013, quando Lee fez sua análise inicial, ela encontrou 39 empresas avaliadas em US$ 1 bilhão ou mais no mercado dos Estados Unidos, nos dez anos precedentes. Hoje, Lee disse que sua companhia conta o dobro desse número. E de acordo com a companhia de pesquisa CB Insight, que conta unicórnios em todo o planeta, existem 117 dessas empresas no mundo, agora.

O crescimento é ainda mais pronunciado se você considerar que Lee estudou empresas de capital aberto e fechado, enquanto os contadores de unicórnios atuais tendem a incluir em seu cômputo apenas as empresas de capital fechado com avaliação superior a US$ 1 bilhão.

Isso pode suscitar uma questão: se unicórnios agora são tão comuns, não deveríamos buscar uma palavra melhor ou uma definição mais seletiva?

Lee discorda. Seu fundo investe em companhias em "estágio de capital formador" –grupos de duas ou três pessoas que mal estão começando a sair do chão. "Trabalho com companhias minúsculas, e na verdade não vivo no mundo dos unicórnios, para ser honesta", ela disse.

Para muitos desses fundadores, a ideia de atingir uma avaliação próxima a US$ 1 bilhão parece um sonho.

"Sei que pode parecer fácil, mas não é fácil, de maneira nenhuma", disse Lee. "Se considerarmos todas as start-ups que existem no mercado, uma avaliação de US$ 1 bilhão é raramente atingida". De acordo com a CB Insights, apenas 1% das start-ups podem esperar se tornar unicórnios.

"Há tanta gente que tenta com muito afinco, e sonha grande, e mesmo assim não consegue", diz Lee. "E, quando consegue, essa vitória pode logo ir embora. Não só é difícil chegar lá como é difícil ficar lá".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

 

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