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25/02/2016 - 13h01

Zappos tenta provar que uma empresa sem chefes pode dar certo

REUVEN GORSHT
ESPECIAL PARA A ENDEAVOR

A Zappos ficou conhecida como sendo o local no qual dois de seus clientes casaram. Agora, ela aplica um conceito totalmente diferente e inovador de gestão, a holocracia.

Quando 14% dos seus funcionários decidem deixar voluntariamente a sua empresa de uma vez, a maioria das organizações apertariam o botão de pânico.

Mas para a Zappos, um e-commerce de calçados e moda de rápido crescimento, o 30 de abril de 2015 representou um ultimato para que os colaboradores optassem por abraçar uma mudança organizacional maciça, chamada "holocracia", ou por receber um dividendo atrativo e deixar a empresa. Resultado: 210 funcionários escolheram partir.

A mudança mais recente que a Zappos tem buscado implementar, ao longo dos últimos três anos, é a sua mudança para uma estrutura organizacional chamada holocracia. Inicialmente concebida pelo auto-descrito "CEO em recuperação" Brian Robertson, a holocracia é um sistema de autoridade distribuída –um conjunto de "regras do jogo " que colocam o empoderamento como núcleo da organização.

Divulgação/Zappos
Zappos
Tony Hsieh, presidente-executivo da Zappos

Pense nisso como o funcionamento de uma organização sem a clássica estrutura de comando e controle, encontrada em muitas das organizações de hoje. Em uma holocracia, a autoridade e tomadas de decisão são distribuídas por equipes auto-organizadas, ao invés de estarem no topo de uma hierarquia.

Como resultado, você poderia esperar uma organização mais flexível e ágil, construída para lidar com mudanças constantes, ao mesmo tempo em que cria uma cultura de empoderamento. Essa cultura distinta faz com que seja muito difícil para qualquer concorrente replicá-la.

Desde que ingressou na Zappos, com 27 anos de idade, o CEO Tony Hsieh tinha estabelecido uma estratégia inovadora para o varejo on-line.

A Zappos é mundialmente famosa por ter estabelecido padrões elevados de qualidade quando se trata de serviço ao cliente. Muitos, inclusive Tony, já disseram que ela é uma "empresa de atendimento ao cliente que, por acaso, vende sapatos e roupas".

Para entregar o fator "wow" (nas palavras da Zappos) aos seus clientes, a equipe de 600 empregados de "Lealdade ao Cliente" que cuidam dos telefones, e-mail e linhas de bate-papo, não são um call-center comum. Eles não seguem scripts ou manuais e possuem muita autonomia.

Desde seus primeiros dias na Zappos, Hsieh sabia que qualquer um poderia montar uma loja on-line e vender sapatos. Um serviço de atendimento marcante, no entanto, tornou-se cada vez mais raro, com muitas organizações enxergando-o como um custo, não um ativo.

A estratégia funcionou e impulsionou a Zappos para mais de US$ 2 bilhões em receitas anuais, em apenas alguns anos.

Então, como entregar "wow"? Hsieh sempre foi claro sobre isso: é questão de ter a cultura certa.

Desde seu início, o CEO tem focado na construção de uma cultura que inclui diversão, criatividade, receptividade à mudança, aprendizagem, entre outros. Para moldar a cultura Zappos, Tony sempre cultivou uma forte cultura de experimentação na empresa.

Ele foi pioneiro em dezenas de práticas por meio de "hacks" que foram pilotadas ou totalmente implementadas em toda a organização, como pagar US$ 2.000 para funcionários deixarem a empresa depois de receberem treinamento.

Isso fez com que tradicionais gestores de RH entrassem em choque. No entanto, para a Zappos, essa mudança caiu como uma luva e trouxe funcionários de alta qualidade, criando um ambiente de trabalho muito bom.

A sede da Zappos, no centro de Las Vegas (EUA), não parece um escritório, é mais como uma vila. É um ambiente onde as pessoas parecem animadas com o que fazem e por que fazem.

Em um edifício renovado que anteriormente abrigava a prefeitura de Las Vegas, encontra-se um espaço meticulosamente desenhado que traz a cultura da Zappos à vida. É um grande espaço para a colaboração, diversão, e o que Hsieh chama de "colisões" (ou encontros imprevistos entre os funcionários).

Os funcionário da Zappos orgulham-se de sua mentalidade colaborativa, muitas vezes ajudando os outros, não importando em qual função ou departamento estão. Eles são guiados por uma missão: do RH ao pessoal da TI, é tudo questão de entrega do "wow" para os seus clientes, não importa sua função ou posição.

Então, por que Hsieh não está satisfeito?

A implementação da holocracia na Zappos é a maior aposta do CEO. A empresa é a maior a já ter adotado a holocracia. É uma jogada que está envolta em risco e incerteza.

Há muitos equívocos sobre holocracia, que se materializaram com o tempo. Com muito crédito para Steve Denning, que tem escrito sobre e dissecado os principais ingredientes da holocracia, alguns equívocos comuns sobre o tema e como eles podem impactar a Zappos são:

1. Uma hierarquia super carregada

O primeiro equívoco sobre a holocracia é que ela não é hierárquica. Enquanto a holocracia coloca muita ênfase no consensual, na tomada de decisão democrática, ela é, na verdade, uma forma explícita e fortemente hierárquica.

Na holocracia existe uma hierarquia de círculos, os quais devem ser executados de acordo com procedimentos democráticos detalhados (eles até têm uma constituição muito detalhada por trás dele). Ao mesmo tempo, cada círculo opera dentro da hierarquia. Cada círculo maior indica a seu círculo mais baixo (ou círculos), qual o seu propósito e o que se espera dele.

Se um círculo não satisfaz o objetivo definido pelo seu círculo maior, ele pode ser mudado, reestruturado ou até mesmo abolido.

O que isso pode significar para a Zappos é que, por mais que o modelo funcione para certas funções (tais como atendimento ao cliente, por exemplo), ele pode ter problemas em funções que exijam muito mais coordenação e liderança do projeto.

2. Sem gestores?

As responsabilidades das "funções essenciais" na holocracia, tais como facilitador e secretário, são exaustivamente explicados, em detalhes, na Constituição da Holocracia. Qualquer responsabilidade que seja desenvolvida é atribuída a um desses papéis. Sugerir que não existem gerentes aqui é uma mentira.

Essa estrutura pode potencialmente levar à competição pelo poder e pela burocracia quando os indivíduos começam a disputar papéis que vêm com um maior potencial e capacidade de tomada de decisão. Não ter gestores não significa que não há pessoas que buscam posições de poder.

3. Apenas siga o manual

Cada círculo deve ser executado de forma democrática e aberta, enquanto governado por procedimentos detalhados sobre como reuniões devem ser geridas, por exemplo.

Mas manuais e scripts podem ser desanimadores. Hoje, a Zappos oferece aos seus funcionários autonomia para que eles sejam capazes de fazer o que é certo para o cliente.

Hoje, a maioria das decisões são guiadas por princípios simples e que seguem os dez valores fundamentais da Zappos.

Como manuais e processos de holocracia vão orientar as decisões? Será que ainda vai ser simples? Será que eles vão continuar se concentrando no prêmio –o seu cliente?

4. E o cliente?

A palavra cliente, ou referências a ela, não aparece uma única vez na Constituição da holocracia.

Isso não quer dizer que os membros de qualquer círculo deixam de sentir uma "tensão" de fracasso em atender às necessidades dos clientes. No entanto, o foco explícito da Constituição da holocracia é totalmente interno. O cliente não está na foto.

Em uma organização onde até mesmo o CEO gasta tempo respondendo a chamadas de serviço ao cliente, em períodos de pico, como a Zappos vai continuar aprimorando sua vantagem competitiva e permanecer em contato direto com um cliente, em uma dinâmica de constante mudança?

Como uma empresa que está continuamente em mudança e experimentação, a Zappos tem uma cultura resiliente com muitas pessoas de mente aberta que se importam com a empresa.

No entanto, essa transformação radical, sem dúvidas, não foi a melhor escolha para todos os que a tentaram implementar, fazendo com que alguns indivíduos parassem no meio do caminho.

A realidade é que nenhum modelo vai ser perfeito para qualquer organização. Ainda não está claro o que Hsieh está tentando resolver com essa aposta.

Será que ele quer mais agilidade? Ele já tem isso. Felicidade? A empresa ganhou mais prêmios de "melhor lugar para se trabalhar" do que qualquer outra em sua indústria. Faturamento? Há maneiras mais fáceis de gerar receita do que mudar uma cultura.

Este artigo foi publicado originalmente no site da Endeavor. Leia aqui

 

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