Análise: Hermético e postiço, jargão incentiva 'espírito de corpo'
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Na maioria dos textos produzidos no universo corporativo, vê-se um registro muito particular da língua, nem sempre compreensível aos "não iniciados". É o que se pode chamar de "jargão corporativo", uma linguagem hoje dominada por grande quantidade de anglicismos e por decalques do inglês -ou ingênuas traduções literais.
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O termo "jargão", que em sua origem quer dizer "fala ininteligível", guarda certa marca pejorativa, fruto de sua antiga associação ao pedantismo -vale dizer que o próprio termo "pedante" faz alusão, entre outros elementos, ao uso da linguagem empolada que faziam certos educadores do passado.
Embora os jargões sejam coisa muito antiga, foi nos séculos 19 e 20 que proliferaram na Europa, fruto de uma maior divisão do trabalho nas sociedades industriais.
Na época, já figuravam entre as suas características o uso de termos de línguas estrangeiras como sinal de prestígio e o emprego de metáforas e eufemismos, exatamente como vemos hoje.
Os jargões são alvo constante de crítica não só por abrigarem muitas expressões de outras línguas, o que lhes confere um ar postiço e hermético, como por seu viés pretensioso.
A crítica a esse tipo de linguagem tem fundamento na preocupação com a "pureza" do idioma e com a perda de identidade cultural, opinião que, para outros, revela traços de xenofobia.
Essa é uma discussão que não deve chegar ao fim tão cedo, mas é fato que o jargão tem claras funções simbólicas: por um lado, visa a incentivar o "espírito de corpo", o que deve justificar o empenho das empresas em cultivá-lo (até para camuflar as relações entre patrão e empregado), e, por outro, promove a inclusão de uns e a exclusão de outros, além, é claro, de impressionar os neófitos.
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO é consultora de língua portuguesa do Grupo Folha-UOL.
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