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26/06/2015 - 07h30

Incorporador inexperiente escolhe hora, lugar e vizinhos errados

MATT A.V.CHABAN
DO "NEW YORK TIMES", EM NOVA YORK

Em pé diante de uma das três quedas d'água em sua casa no bairro de Chelsea, Manhattan, Colin Rath, 52, sorria. A água alimentava um estreito tanque de carpas que se estende por todo o comprimento da sala de estar e reproduz as curvas do rio Yangtze, na China. "É muito pacífico, aqui", ele disse.

Já o que ele desejava fazer no prédio ao lado é outra história, que Rath decidiu contar em um livro que ele mesmo publicou. É difícil determinar se foi um caso de muito azar ou um erro horrendo de cálculo. O que o episódio revela são os notáveis excessos que prevaleciam uma década atrás, e talvez já tenham ressurgido, na cidade de Nova York.

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"Fomos ao inferno e voltamos, já nem sei quantas vezes", disse Rath, refletindo sobre as duas décadas que ele viveu no quarteirão, e sobre os dez anos que passou tentando construir o seu "sonho verde", um edifício de apartamentos de luxo com oito andares.

Concebido para estar adiante de seu tempo, empregando todo o luxo e toda a tecnologia imaginável, o projeto, em lugar disso, terminou por afundar o seu criador. Em 2010, Rath abandonou as obras, e só guarda delas um grupo de 27 credores que clamam por seus milhões de volta, bem como amigos e parentes que perderam a paciência com a ideia.

Rath e a mulher, Pamela Harvey-Rath, eram forasteiros no feroz mundo da incorporação imobiliária nova-iorquina. Ele trabalhava com o pai em uma empresa de vendas por mala direta em Stamford, Connecticut, e ela era galerista.

Depois do sucesso na construção de uma exótica casa na rua 15, no número 121, com tetos curvos e papéis de paredes com temas de história em quadrinhos, eles estavam prontos para largar o trabalho e sair velejando pelo mundo. Mas decidiram, em lugar, disso adquirir o edifício vizinho, que alugava quartos de hóspedes, e, em 2003, compraram o número 123 da rua 15 por US$ 1,6 milhão.

O plano era unir o edifício à edificação em que viviam, construir apartamentos nos andares superiores e, mais tarde, usar a receita dos aluguéis de seu edifício duplo para financiar sua viagem.

Jason Stoikoff/The New York Times
LEGENDA AQUI
Os vizinhos comparavam a cobertura curva de três pavimentos do projeto a uma nave espacial alienígena

O livro, intitulado "It Is What It Is" ("É O Que É"), fala não só das pessoas que Rath acredita que o tenham prejudicado, mas também dos erros que ele cometeu. É um texto notavelmente franco, confiante e, às vezes, um tanto desdenhoso.

BARREIRAS

Desde o começo, os Rath encontraram problemas. O edifício vizinho abrigava nove inquilinos com contratos longos, e foi preciso pagar para que saíssem, o que custou US$ 525 mil. Com o prédio enfim vazio, em 2006, a demolição começou.

O projeto para o novo edifício previa poços geotérmicos e uma plataforma rotativa de garagem para três carros –Rath estava frustrado por ter de estacionar seu Porsche na rua.

A característica mais notável, ou chocante, da proposta era uma cobertura curva de três pavimentos, que muitos vizinhos comparavam a uma nave espacial alienígena. As objeções dos demais moradores e proprietários do quarteirão terminaram por chegar ao conselho de bairro e, por fim, a Christine Quinn, então presidente do Legislativo municipal e vereadora que representava Chelsea.

As queixas dos demais proprietários do quarteirão resultaram em numerosas revisões pelas autoridades municipais e a uma redução na altura autorizada do edifício a sete andares.

Os Rath sofreram para encontrar financiamento para o projeto, mesmo nos anos de investimento descontrolado no setor de imóveis, e tiveram de fechar com uma instituição de empréstimos de Long Island que lhes cobrou juros de 13%, o equivalente a US$ 5 mil ao dia.

Quando as fundações começaram a ser escavadas, os temerosos vizinhos no número 125 procuraram Rath e solicitaram US$ 20 mil para que pagassem por um arquiteto e engenheiro que inspecionassem a obra em nome deles. Rath descreve a abordagem no livro como extorsão. Os vizinhos se recusaram a comentar.

No entanto, bem pode ser que os vizinhos tivessem motivo para preocupação.

Em um dia chuvoso de dezembro de 2006, os operários estavam trabalhando sob a fundação, construída em 1853, quando uma porção dela desabou, quase esmagando um dos trabalhadores, que quebrou uma perna.

Rath descobriu que as novas estacas planejadas para sustentar a velha fundação não tinham sido fincadas em profundidade suficiente, e teve que gastar mais US$ 3 milhões alterando o projeto e reconstruindo tudo.

Ele não havia avançado além da construção da estrutura de aço da nova fundação quando o banco Lehman Brothers implodiu, arrastando com ele não só o seu projeto como muitos outros, com a contração do mercado de crédito.

Tina Fineberg/The New York Times
Colin Rath sob um teto feito de bolas de gude em seu condomínio em Nova York
Colin Rath em seu condomínio em Nova York

DESEQUILÍBRIOS

No livro, Rath dedica muito espaço a acusar diversos empreiteiros e credores de fraude, e a questionar o estado mental de alguns vizinhos que atacaram o projeto. Robert Boddington, diretor da associação do quarteirão, é descrito como "seriamente desequilibrado" e "diagnosticável", e acusado de gritar com os filhos de Rath.

"O livro dele", disse Boddington em entrevista, "parece ser construído sobre mentiras, como seus edifícios".

Rath diz que não se preocupa com acusações de difamação, porque fez seguro contra isso. Além disso, ele diz, "ninguém pode ser processado por dizer a verdade".

Rath passou os dois anos seguintes batalhando com um credor depois do outro, tentando encontrar uma maneira de salvar o projeto. Por fim, entregou o imóvel ao banco credor em 2010. Em um ano, um edifício para locação, com seis andares, foi concluído no local, com cara de uma townhouse tradicional de pedra calcária, o que Rath descreve como "nada inspirado".

"Se você for ver, todo o trabalho que estávamos fazendo, de sustentabilidade, construção em cantiléver, tudo pelo que fomos ridicularizados, agora está em uso generalizado", afirma Rath.

Ele terminou perdendo milhões de dólares, a maior parte dos quais emprestados pelo pai. A esperança é que a venda de sua casa, que está sendo oferecida por US$ 3,1 milhões agora, depois de uma pedida inicial de US$ 4,1 milhões, ajude a cobrir parte das dívidas.

O Bank of America, seu credor pelo projeto, tentou executar a hipoteca quando Rath parou de pagar, mas em meio à insanidade da crise hipotecária não conseguiu provar que tinha direito ao imóvel. A despeito dos apelos do banco de que Rath estava tentando lucrar com a situação, um juiz anulou a dívida no ano passado.

Rath vem alugando a casa por US$ 10 mil ao mês desde 2010, quando transferiu sua família para Connecticut, onde eles estão velejando em tempo integral. Depois de passar o inverno no Caribe, a família agora planeja velejar para a Europa nos próximos meses em um iate Hansa 545, antes de sua viagem ao redor do mundo. O iate construído sob medida se chama Persevere, um lembrete de tudo pelo que tiveram de passar.

"Estamos pensando em nos radicar na Nova Zelândia", ele disse. "Os Estados Unidos já não são o país que um dia conheci".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

 

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