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11/08/2013 - 02h30

Profissionais mostram como o azar influenciou suas carreiras

FELIPE GUTIERREZ
DE SÃO PAULO

Lucas Peschkchke, diretor da consultoria de RH Hays, conta que na área dele é um chavão dizer que o sucesso profissional é baseado em um tripé. A frase, no entanto, tem variações: às vezes fala-se de talento, de preparo ou de relacionamento. Só um item nunca muda: a sorte.

Em seu último discurso como conselheiro do presidente Obama, o economista Alan Krueger, da Universidade Princeton, fez uma paralelo entre o mercado de trabalho e a trajetória de músicos.

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"É difícil antever o sucesso. Nada garante que ele acontecerá, mesmo para os mais talentosos. A sorte tem um papel importante."

E, se um artista é percebido como bem-sucedido, mais gente irá se interessar por ele, em um comportamento de manada. No mercado de trabalho, a lógica é a mesma, diz Krueger.

Um estudo publicado por três economistas norte-americanos mostra como os empregadores atuam dessa forma.

Para Peschkchke, define-se a sorte, no mundo corporativo, como "estar no lugar certo na hora certa".

A consultora de inovação e marketing Martha Terenzzo, 50, estava em uma grande empresa na hora errada, e teve sua trajetória profissional bastante alterada.

Zé Carlos Barretta/Folhapress
André Gertsenchteing começou a carreira de engenheiro civil em época que o mercado não era favorável a ele
André Gertsenchteing começou a carreira de engenheiro civil em época que o mercado não era favorável a ele

Terenzzo era diretora de marketing da Bombril no fim dos anos 1990, mas recebeu uma proposta e foi trabalhar na Parmalat.

Um dia, ela e os colegas souberam que o fundador e presidente da empresa estava sendo investigado na Itália. Descobriu-se, em seguida, que na sede havia maquiagem de balanços de resultados. O líder máximo da multinacional acabou preso.

"Entre os headhunters [recrutadores], a marca da Parmalat causava um estranhamento. Como os executivos fariam para se recolocar? Eu não me sentia a pessoa mais sortuda do mundo."

Ela foi contratada pela Aji-No-Moto, mas, antes disso, teve que ser medicada por conta de uma depressão.

Terenzzo conta que nem ela nem os colegas tinham ideia do estado real das finanças da Parmalat no período.

Para o economista Gilson Schwartz, professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, a escolha de um trabalho é essencialmente uma decisão econômica. Ao se decidir por um rumo profissional, é impossível ter todas as informações a respeito do mercado em questão, "ou então só faríamos vestibular aos 60 anos".

Schwartz exemplifica como é impossível tomar uma decisão profissional com todas as cartas na mão: na década de 1970, o mercado de construção civil estava em alta, "e todo mundo queria ser engenheiro civil, mas depois de alguns anos muita gente ficou sem ter o que fazer".

"O mercado na segunda metade dos anos 1980 estava terrível, terrível, terrível", confirma André Gertsenchteing, que se formou nessa época e que hoje é diretor do Fundação para o Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia.

Ele conta que, quando começou a trabalhar, ganhava menos do que o piso da categoria e que o mestre de obras recebia um salário mais alto que o dele.

Os engenheiros civis que se formaram nos anos recentes deram sorte pela falta de mão de obra no setor de construções, diz Gertsenchteing. "Mas na minha época, a maioria dos meus colegas foi parar em banco", afirma.

Hoje, no setor financeiro, segundo o "coach" José Roberto Marques, do IBC Coaching, aumentou o número de gerentes que perderam suas vagas por causa das recentes fusões e aquisições.

Ele afirma ter atendido cerca de dez nessa situação nos últimos dois anos.

A gerente de contas Neiva Cardone, 43, foi uma das que saíram de um grupo por causa da onda de grandes empresas que decidiram se juntar.

"Dei azar", afirma. A instituição na qual trabalhou por 19 anos, cujo nome ela prefere não revelar, juntou-se a um outro grupo, e, segundo ela, as "culturas empresariais" eram muito diferentes.

Editoria de Arte/Folhapress

No fim do ano passado, foi demitida. Ela diz conhecer outras dez pessoas que perderam a vaga da mesma forma. Cardone achou um novo emprego depois de dois meses. No entanto, está em um nível hierárquico abaixo daquele que já tinha alcançado.

Ana Luísa Pliopas, coordenadora de estágios e colocação profissional da Fundação Getulio Vargas, conta que, além das fusões, outros fatores, como a queda nas taxas de juros, influenciam na oferta de vagas.

Isso se reflete até mesmo na quantidade de vagas em processos para trainee ou recém-formados, segundo ela.

Ainda assim, diz Pliopas, a conjuntura para os alunos que tiveram "a sorte" de se formar agora é bem diferente da de 2002 e 2003.

"Era um horror. Havia um clima de instabilidade sobre o que ia acontecer na economia com a eleição do Lula."

Segundo Pliopas, quem se formava na faculdade na época tinha mais dificuldade para encontrar espaço e isso "não tinha nada a ver com o quão bom aluno ele era, a escola que tinha feito ou se sabia se portar em entrevista".

Começar em um mercado ruim "vai marcar o profissional para o resto da trajetória dele, porque ele irá demorar para ter experiência e chegar às posições de chefia", diz a economista Lucia Garcia, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).

DEPOIS DE NOVE MESES

Ernesto Haikewitsch, 50, hoje na Gemalto, ficou desempregado em 2003, o ano que, segundo o Dieese, teve o pior índice dos dez últimos.

Ele conta que, no período, chegou a ser chamado para duas posições que, antes de ele assumir, foram canceladas: "Não fui preterido, as vagas fecharam".

Foram nove meses até ele achar um lugar em um grande banco.

A duração do desemprego começa a atrapalhar demais a chance de recolocação depois da marca dos oito meses, segundo o economista Fabian Lange, da Universidade McGill, de Montréal, no Canadá. "E os dados mostram que, depois de um ano [sem trabalhar], o profissional recebe uma resposta a cada 25 inscrições para vaga."

Quem está há muito tempo sem trabalhar deve considerar uma posição abaixo das suas expectativas. "Nosso estudo sugere que é arriscado ser muito exigente, pois isso reduz muito as chances de recolocação".

Karime Xavier/Folhapress
Ernesto Haikewitsch, hoje na Gemalto, saiu de uma empresa em 2003, o ano com o pior índice de desemprego nos últimos dez
Ernesto Haikewitsch, hoje na Gemalto, saiu de uma empresa em 2003, o ano com o pior índice de desemprego nos últimos dez
 

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