Variedade de cursos superiores estimula aumento do entra e sai em faculdades
MÁRCIO FERRARI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Do total de ingressantes em instituições de ensino superior brasileiras, 13,6% não concluem o curso, segundo o censo de 2013. O número aumentou 5,9% em relação ao ano anterior.
Embora a evasão não seja um fenômeno que historicamente varie de forma acentuada em termos percentuais, hoje significa mais em escala, porque o número de cursos superiores quase duplicou entre 2003 e 2013 (16,5 mil para 32 mil).
A maior oferta é um fator de aumento da evasão. "A diversificação causa mais dúvidas", diz Wille Muriel, diretor da Carta Consulta, empresa de Belo Horizonte especializada em gestão de ensino. Para ele, a desinformação leva o aluno a comprar um pacote fechado. "Se não se sente satisfeito, vai embora."
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O planner digital Bruno Etchepare, entrou aos 17 anos na faculdade de farmácia e bioquímica da Unesp, baseado no que gostava de estudar no ensino médio.
"Não tinha ideia de qual era a rotina do pesquisador e achei todas as disciplinas chatas", diz. Ficou um ano.
Em termos gerais, ele acha que cursos superiores não ensinam a pensar criticamente. "É só assimilar e mais nada."
Fabio Braga/Folhapress | ||
Bruno Etchepare, 28, planner digital |
Depois, namorou a ideia de cursar audiovisual, desistiu na última hora por achar que não atingiria a nota de corte e fez um X na opção arquitetura. Passou na concorrida FAU (Faculdade de Arquitetura da USP).
DECEPÇÃO
"Desenho exige ficar sentado quatro horas seguidas e eu não consigo ficar nem meia hora", diz Etchepare. Aguentou quatro anos. Quando já estava perto de largar as mesas de projeto, recebeu um convite para um trabalho de férias num site de arquitetura. Tudo mudou.
Aos 23, ele continuava no emprego e teve a ideia de postar informações nas redes sociais conseguindo, em oito meses, mais do que duplicar a audiência do site.
Etchepare, agora com 28 anos e em outro site, cuida de projetos bem mais complexos. O pensamento crítico e a criatividade ele desenvolve em cursos livres. "Não são sobre o que faço, mas sobre relações pessoais com as quais trabalho", diz. Sem diploma universitário, afirma: "Nunca procurei emprego e nunca fui mandado embora."
"Os departamentos de Recursos Humanos estão interessados em saber se o profissional sabe ou não fazer o que é necessário, não em seus títulos", diz Muriel. Para ele, cursos livres e de extensão podem fazer um sentido que as universidades, às vezes, não fazem para os alunos.
"A necessidade de ensino superior é supervalorizada no Brasil", diz Maria da Conceição Uvaldo, coordenadora do Serviço de Orientação Vocacional da USP. "Todos têm que ter acesso, mas não quer dizer que todos têm que fazer. As pessoas são diferentes", diz ela, que é psicóloga.
CERTEZA PREOCUPANTE
Hoje, segundo Maria da Conceição, "a pressão social por entrar num curso superior leva os questionamentos sobre a escolha da faculdade para dentro da própria faculdade". Ela mesma trabalha no Núcleo de Orientação Profissional da USP (atende jovens acima de 14 anos).
"Não há política pública para orientação vocacional, e a decepção com a realidade pode ser muito grande", diz. Como exemplo extremo, ela cita a frustração de alunos que gostariam de seguir a profissão de psicólogo forense, mas se desencantam ao ver que a vida desse profissional não é a mesma dos personagens do seriado "CSI".
Para se informar e evitar se guiar por estereótipos, a psicóloga recomenda que o pré-candidato vá além da busca na internet e procure feiras de profissões, grupos de discussão, visitas guiadas e conversas com quem já está dentro. "O mais importante é se perguntar o que gosta de fazer", diz. Para ela, "aqueles que sempre tiveram certeza da carreira que querem seguir são os que mais preocupam".
"O ideal é que a escolha considere os fatores externos, mas só depois de pesar os pessoais", diz Renata Magliocca, gerente de inovação da recrutadora de estagiários e trainees Cia de Talentos.
Uma vez na faculdade, o aluno em dúvida deve frequentar aulas e conversar com alunos dos semestres avançados. "O jovem deve levar em conta que os dois primeiros anos são distantes do dia a dia profissional."
Às vezes, só tentando se acha a saída. Herbert Silva, 26, escolheu um curso técnico, o Teatro Escola Macunaíma, em São Paulo, ao sair do ensino médio. Tornou-se ator e "muitas portas se abriram", mas achou que sua formação "deixava a desejar".
Sua queixa é que o currículo "era fechado na interpretação teatral". Em seguida tentou faculdade de letras, mas a "grade rígida" o levou a trancar matrícula depois de um semestre.
Quando Herbert se uniu a um grupo de teatro, começou a "entender o que faltava": conhecimento de produção e gestão cultural.
Encontrou o curso que queria na UFBA (Universidade Federal da Bahia). Mudou-se para Salvador, onde cursa o bacharelado interdisciplinar em artes, escolhido, entre outas coisas, pela flexibilidade do currículo.
Continua a trabalhar como ator. "Mas dou prioridade à universidade. Eu me vejo daqui a alguns anos como gestor cultural."
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