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27/01/2013 - 05h23

Cursos de pós ficam mais globalizados, com intercâmbios e aulas em inglês

GABRIEL VITURI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em agosto de 2009, Eduardo Barbosa ainda cursava o início de seu mestrado na FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP) quando um contato feito nos corredores da universidade abriu portas que mudariam o último semestre de sua pós-graduação.

Lucas Lima/Folhapress
Eduardo Colagrossi Paes Barbosa, que fez parte da pós-graduação no Canad
Eduardo Colagrossi Paes Barbosa, que fez parte da pós-graduação no Canad

Um professor canadense que passava uma temporada na instituição ministrando aulas e cursos se interessou pela dissertação do aluno brasileiro sobre mudanças climáticas e o uso do solo no país e o encorajou a tentar uma bolsa de estudos na McMaster University, em Hamilton. Aprovado, o economista de 27 anos ficou seis meses no Canadá para se dedicar exclusivamente à pesquisa de mestrado, que defendeu ao voltar ao Brasil, em 2011.

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Cada vez mais comum nas Instituições de Ensino Superior, a internacionalização dos cursos de pós-graduação se transformou em um processo irreversível. Defendida por representantes de faculdades públicas e particulares, a ação de tornar-se internacional está entre as maiores prioridades no planejamento estratégico de dezenas de escolas no país. A definição mais abrangente e predominante sobre o que significa o termo em si foi dada por Jane Knight, da Universidade de Toronto. Em seus estudos, a pesquisadora defende que internacionalização é o "processo no qual se integra uma dimensão internacional, intercultural ou global nos propósitos, funções e oferta de educação pós-secundária".

Embora seja frequentemente associado a programas em que alunos e docentes são enviados a outros países para um período de estudos, o ato de tornar-se internacional envolve uma série de ações que nem sempre demandam o intercâmbio.

"Internacionalizar inclui mobilidade, que é o ato de mandar para fora, mas também existem alternativas dentro da própria escola, sem necessariamente deslocar pessoas da instituição", explica Sérgio Pio Bernardes, diretor de internacionalização da ESPM-SP. Segundo o professor, adotar currículos que tenham conteúdos estrangeiros, organizar palestras e oferecer aulas em outros idiomas são pequenos passos que podem levar a uma mudança bem sucedida. O caso do economista da USP, diz o especialista, é relativamente comum: "A internacionalização sempre começa no meio da pirâmide, com um professor que conhece alguém em congressos, ou quando há algum tipo de relação com instituições de fora".

Editoria de Arte/Folhapress

Estudar em uma universidade pública e receber bolsa-auxílio de uma faculdade estrangeira não é exceção, mas ainda pode ser considerado um exemplo menor se comparado à quantidade de alunos brasileiros que participam de programas no exterior com apoio de bolsas bancadas por agências federais (Capes e CNPq) e estaduais. Por ser um processo de alto custo, poucas instituições privadas nacionais têm condições de garantir a estrutura necessária a seus estudantes fora do país.

Já a Capes, criada em 1951, deve distribuir mais de 100 mil bolsas de estudos até 2015, em um investimento que ultrapassa os R$ 3 bilhões.

Gabo Morales/Folhapress
Os pesquisadores Gustavo Wiederhecker, 31, e Vania Pereira, 33, da Unicamp, conseguiram bolsas para estudar fora do país
Os pesquisadores Gustavo Wiederhecker, 31, e Vania Pereira, 33, da Unicamp, conseguiram bolsas para estudar fora do país

Carolina Kesser Barcellos Dias é historiadora pela Unesp e se dedicou à arqueologia durante a pós-graduação no MAE-USP (Museu de Arqueologia e Etnologia da USP). Por conta de sua especialidade, as cerâmicas gregas, ela teve oportunidade de estagiar em instituições europeias em diferentes ocasiões com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), um diferencial enorme na área, sobretudo pelo contato direto com o material de estudo e pelo acesso a uma bibliografia ainda inexistente no Brasil.

Na visão da arqueóloga, "o apoio institucional é o primeiro e mais importante meio nesses processos. O nome 'USP' é forte, e ele abre portas no exterior. As pessoas reconhecem essa universidade lá fora".

ALTERNATIVAS

"Há vários programas de cooperação técnica entre países, mas não se deve pensar apenas em mecanismos que dependam do governo", defende o gerente de relações internacionais da FGV (Fundação Getulio Vargas), Eduardo Marques. O professor cita como alternativa fundações e bancos que fornecem bolsas-auxílio. "Uma boa opção também são os acordos de cooperação acadêmica com isenção de cobrança de matrículas e mensalidades entre as entidades, permitindo ao aluno em intercâmbio que não tenha despesas acadêmicas na instituição de destino, mantendo o pagamento apenas na sua entidade de origem", complementa.

Apesar de o governo ser o maior incentivador em pesquisas e estágios internacionais, a morosidade de algumas questões na pasta da Educação é apontada como um entrave a mudanças imediatas. "O Estado é muito mais lento que a sociedade civil, há um descompasso. As inovações são rápidas, mas não são incorporadas como legislação", pondera Sérgio Bernardes, da ESPM.

Gabo Morales/Folhapress
Carolina Kesser Barcellos Dias, 35, que graças ao Museu de Arqueologia e Etonologia da USP pôde estudar cerâmicas gregas no exterior
Carolina Kesser Barcellos Dias, 35, que graças ao Museu de Arqueologia e Etonologia da USP pôde estudar cerâmicas gregas no exterior

Para Luiz Alberto Machado, vice-diretor da Faculdade de Economia da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), chega a ser "desestimulante" a burocracia observada em alguns processos. "Quando um estudante tem como objetivo investir na carreira acadêmica e precisa revalidar algum título, ele consegue isso com muito mais facilidade em qualquer outro lugar do mundo", lamenta o professor. Hoje em dia, o reconhecimento de títulos cursados no exterior, que deve ser feito por instituições públicas, pode demorar até um semestre para ser finalizado.

Além disso, a falta de domínio de idiomas estrangeiros foi apontada por todos os especialistas procurados pela Folha como um dos maiores empecilhos para a internacionalização.

"Se o governo brasileiro realmente quer pensar em uma educação globalizada, é preciso se preocupar com a qualidade do ensino de línguas já no Ensino Médio, sobretudo o inglês, que é pré-requisito para ter acesso à bibliografia internacional", alerta o representante da ESPM. Essa deficiência estrutural afeta sobretudo a internacionalização ativa, aquela em que docentes e alunos estrangeiros são recebidos em instituições nacionais.

Na opinião de Gustavo Wiederhecker, que foi ao exterior durante o doutorado e o pós-doutorado pela Unicamp graças a bolsas da Capes e da Fapesp, atrair estudantes de fora está entre os fatores mais importantes. "A pós-graduação no Brasil, em muitas áreas, carece de alunos", diz ele. Professor de física na mesma universidade, Wiederhecker diz que o curso em que leciona é um bom exemplo entre os que são beneficiados pela vinda de pesquisadores de outros países.

Vania Rosa Pereira, doutora em geografia pela Unicamp e mulher do físico, fez parte da pós na universidade de Cornell, no estado de Nova York, e destaca outro desequilíbrio. "Temos problemas de espaço nas universidades brasileiras. O laboratório nos Estados Unidos tinha muitos pós-graduandos e uma infraestrutura fantástica para trabalhar, com equipamentos, bibliotecas e serviços técnicos de fácil acesso", lembra.

ESCRITÓRIOS ESTRANGEIROS

A necessidade de tornar-se internacional tem feito com que IES estrangeiras instalem sedes em países onde há acordos de cooperação e interesses mútuos. Em dezembro do ano passado, a Nova School of Economics Business (NSBE), de Lisboa, inaugurou um escritório em São Paulo para propiciar o intercâmbio entre Brasil e Portugal de forma direta. Eleita pelo "Financial Times" como uma das escolas mais capacitadas nos cursos de finanças, a Nova incorporou à sua estratégia o inglês como primeiro idioma.

Segundo João Amaro de Matos, cerca de 40% dos alunos que estudam na sede europeia não dominam a língua lusitana. "Temos docentes que nem sequer falam português", diz o professor, que viveu quase três décadas no Brasil. Para ele, a língua inglesa torna os programas flexíveis e "coloca no mercado profissionais preparados para qualquer lugar, polivalentes". A NSBE, além de São Paulo, também está presente em Luanda, na Angola, e começa agora a integrar os três países com intercâmbios voltados para área de logística e infraestrutura.

Uma forma que as instituições encontraram para sistematizar ações como essa foi criar departamentos específicos para o assunto. O contato com instituições de fora e a relação entre alunos e professores, daqui e de lá, é facilitado e agiliza o processo. O professor Luiz Alberto Machado, da FAAP, defende a mudança institucional: "Com a criação de um departamento, o aluno que hoje quer ir para fora recebe orientação especializada e depois discute com o coordenador do curso o que é mais conveniente e compatível com o que ele busca".

Na ESPM isso começou a ser deliberado em 2007; para estruturar o departamento, foi contratada uma consultoria internacional que criou a diretoria, e hoje, além de espaço físico, existe também um orçamento exclusivo para ações de internacionalização.

Considerado um processo transversal, em que todas as esferas da escola devem estar envolvidas - "do porteiro aos professores", diz Sérgio Bernardes -, tornar-se internacional é uma preocupação que impactou todas as instituições, mesmo as que acreditavam que poderiam ficar alheias a essas mudanças. "A questão da internacionalização é irreversível e necessária, porque o mercado é global", reforça. O representante da ESPM conclui: "Hoje há mobilização da sociedade civil, professores buscam qualificação e faculdades viabilizam o processo. O que vai diferenciar é o grau de excelência de cada instituição, esse é o desafio agora".

 

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